sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Educação Inclusiva: o legal e o real

Por: Lucival Santos

O histórico das pessoas surdas, no Brasil, é algo que vem merecendo destaque no meio educacional e gerando polêmicas bastante plausíveis. O que antes era visto como “deficiência” e ausência de capacidade, hoje é considerado como sendo “diferente”. Com a Lei 10.436 de 24 de abril de 2002, os surdos têm outros métodos de aprendizado, por meio da Língua Brasileira de Sinais, tornando-os aptos a exercer seus direitos de cidadãos. Contudo, é com a criação do Decreto 5626 de 22 de dezembro de 2005, que os surdos ganham respaldo significativo no âmbito educacional.
Segundo Claudia Pereira Dutra, secretaria de Educação Especial/ MEC o desafio da educação brasileira é a implementação da política de inclusão educacional de promoção do acesso e da qualidade na educação básica, com a organização de escolas que atendam a todos os alunos sem nenhum tipo de discriminação, escolas que valorizem as diferenças como fator de enriquecimento do processo educacional, transpondo barreiras para a aprendizagem e a participação com igualdade de oportunidades.
Ela afirma que é com o propósito de garantir que a inclusão aconteça que foi criado o Decreto 5626 de 22 de dezembro de 2005, reforçando a Lei 10.436/02 que oficializa Libras como disciplina obrigatória no curso de formação de professores. Vejamos o Capítulo I deste Decreto que regulamenta a inclusão da Libras como disciplina curricular:
Art. 3º A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudióloga, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
§ 1o Todos os cursos de licenciatura, nas diferentes áreas do conhecimento, o curso normal de nível médio, o curso normal superior, o curso de Pedagogia e o curso de Educação Especial são considerados cursos de formação de professores e profissionais da educação para o exercício do magistério.
Vale lembrar, que uma vez que se torna obrigatório o ensino da disciplina nas universidades e escolas é preciso buscar profissionais que tenham competência para assumir a função. Neste sentido, vejamos o que está no Decreto Capítulo III Art. 4o A formação de docentes para o ensino de Libras nas séries finais do ensino fundamental, no ensino médio e na educação superior deve ser realizada em nível superior, em curso de graduação de licenciatura plena em Letras: Libras ou em Letras: Libras/Língua Portuguesa como segunda língua. Cabe lembrar que também está explicito no Decreto, o instrumento de avaliação dos requisitos para o profissional do ensino de Libras:
Art. 8o O exame de proficiência em Libras, referido no art. 7o, deve avaliar a fluência no uso, o conhecimento e a competência para o ensino dessa língua.
§ 1o O exame de proficiência em Libras deve ser promovido, anualmente, pelo Ministério da Educação e instituições de educação superior por ele credenciada para essa finalidade.
§ 2o A certificação de proficiência em Libras habilitará o instrutor ou o professor para a função docente.
§ 3o O exame de proficiência em Libras deve ser realizado por banca examinadora de amplo conhecimento em Libras, constituída por docentes surdos e lingüistas de instituições de educação superior.
Além do professor de Libras, as instituições devem oferecer à comunidade surda a presença do interprete, pessoa responsável pela mediação do diálogo entre o surdo e o palestrante/professor.
Art. 21. A partir de um ano da publicação deste Decreto, as instituições federais de ensino da educação básica e da educação superior devem incluir, em seus quadros, em todos os níveis, etapas e modalidades, o tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa, para viabilizar o acesso à comunicação, à informação e à educação de alunos surdos.
§ 1o O profissional a que se refere o caput atuará:
I - nos processos seletivos para cursos na instituição de ensino;
II - nas salas de aula para viabilizar o acesso dos alunos aos conhecimentos e conteúdos curriculares, em todas as atividades didático-pedagógicas;
III - no apoio à acessibilidade aos serviços e às atividades-fim da instituição de ensino.
Embora o Decreto assegure ao surdo o direito à língua oral (Língua Portuguesa), ao contrário do que previa o Oralismo que obriga o surdo a aprender, ignorando sua língua “materna”, que lhe garante a construção da identidade, a língua de sinais (Libras). Devemos ressaltar que o documento classifica como facultativo, cabendo ao educando ou a família optar pelo atendimento a língua oral.
Art. 22. As instituições federais de ensino responsáveis pela educação básica devem garantir a inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, por meio da organização de:
I - escolas e classes de educação bilíngüe, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores bilíngües, na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental;
II - escolas bilíngües ou escolas comuns da rede regular de ensino, abertas a alunos surdos e ouvintes, para os anos finais do ensino fundamental, ensino médio ou educação profissional, com docentes das diferentes áreas do conhecimento, cientes da singularidade lingüística dos alunos surdos, bem como com a presença de tradutores e intérpretes de Libras - Língua Portuguesa.
§ 1o São denominadas escolas ou classes de educação bilíngüe aquelas em que a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa sejam línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo o processo educativo.
No entanto, não podemos perder de vista Quando a questão é educação de surdos, as atenções se voltam para a aprendizagem de Língua Portuguesa, comparações entre as Línguas de Sinais e as línguas orais, construção de identidade, valores culturais. Ao se tratar educação matemática de surdos, há uma defasagem de material bibliográfico que sirva de base para os professores. As publicações que abordam o tema são insuficientes para atender às especificidades desses estudantes.
A inclusão de surdos tem se resumido ao intérprete em sala de aula, mas para que esses sujeitos construam conhecimento e desenvolvam competências é preciso mais que isso. Toda informação, para ser apreendida e compreendida pelo surdo, deve passar e explorar sua competência mais desenvolvida, que é a visual-espacial. O uso da língua de sinais acarreta, além de uma comunicação diferente, também um processo de percepção e compreensão distintas – apoiadas nessa língua diferente. Enquanto os professores basearem suas aulas somente em estímulos da esfera auditivo-oral, não ocorrerá inclusão desses sujeitos na escola.
De modo geral, a transformação dos sistemas educacionais para a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais significa uma mudança na gestão da educação que possibilite o acesso às classes comuns do ensino regular e a ampliação da oferta de atendimento educacional especializado que propicie a eliminação de barreiras para o acesso ao currículo. Uma nova gestão dos sistemas educacionais que priorize ações de ampliação da educação infantil, o desenvolvimento de programas para a formação de professores, a adequação arquitetônica dos prédios escolares para acessibilidade e a organização de recursos técnicos e de serviços que promovam a acessibilidade pedagógica e nas comunicações.
Assim, o investimento em profissionais intérpretes na LIBRAS também é um aspecto importante, dessa forma, ouvintes e surdos poderão compartilhar seus pontos de vista, suas curiosidades e compreender mundos diferentes (entende-se: pessoas diferentes). A contratação de professores surdos também é um aspecto de relevância, levando-se em consideração que os mesmos têm fluência na LIBRAS e certamente passaram por situações similares aos alunos surdos, o que os levará a se identificar com o professor e a criar, automaticamente, uma auto – imagem positiva. No caso do Brasil, ainda incipiente na LIBRAS, demorará um tempo significativo para que a Comunidade Surda obtenha o sucesso e o respeito almejados.
Em suma, o fato de ter sido criado a Lei e o Decreto que tornam obrigatório a inclusão da Libras na educação básica ou na escola regular, não garantem a formação adequada dos alunos surdos, uma vez que o próprio sistema educacional não oferece recursos materiais para adaptar estas instituições de ensino a tão sonhada inclusão. Por outro lado, o primeiro passo já foi dado, a LIBRAS não é somente uma junção de sinais, mas sim, uma língua própria da comunidade surda, assim como o português caracteriza o meio de comunicação entre brasileiros ouvintes. Acredito que ainda que num processo lento aproximemos o legal do real, desde que enquanto educadores nos comprometemos nessa jornada.

REFERENCIAS

BOTELHO, Paula. Linguagem e Letramento na educação dos surdos – ideologias e práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2002.
FERNANDES, Sueli F. Práticas de letramento na educação bilíngüe para surdos. Curitiba: SEED, 2006.
LACERDA, Cristina B. F. de. Um pouco da história das diferentes abordagens na educação dos surdos. Cad. CEDES vol.19 n.46 Campinas, Set. 1998.

OLIVEIRA, Janine Soares de. A comunidade surda: perfil, barreiras e caminhos
promissores no processo de ensino aprendizagem em matemática/Janine Soares de Oliveira. ---2005.

VYGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem, 2 ed. São Paulo, Martins Fontes, 1998.

http://www.ines.org.br/ines_livros/15/15_PRINCIPAL.HTM.
Acesso em 11/05/09 às 17:00 h.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm
Acesso 11/05/09 Às 19:00 h.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10436.htm
Acesso 11/05/09 Às 22:00 h.

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